O presidente da Liga Portuguesa de Futebol Profissional (LPFP) entre 2012 e 2014, Mário Figueiredo, acusou esta sexta-feira, em tribunal, o Porto Canal de ter deturpado e omitido emails para demonstrar que o Benfica controlava, em 2017, o mundo do Futebol. E defendeu que a estação tinha mensagens que mostram que o domínio pertencia ao FC Porto.
Em causa está a divulgação em 22 episódios do programa Universo Porto de Bancada, entre 18 de abril de 2017 e 20 de fevereiro de 2018, de centenas de e-mails que foram ilegalmente retirados do sistema informático do Benfica e enviados anonimamente para Francisco J. Marques , diretor de comunicação do FC Porto e depois comentador regular do formato.
Os emails foram, segundo o Ministério Público, selecionados por Diogo Faria, atual diretor de conteúdo do Porto Canal. O alinhamento do programa seria de conhecimento do então diretor-geral da emissora, Júlio Magalhães.
Entre as mensagens então tornadas públicas, há duas enviadas, em 2014, por Mário Figueiredo a Luís Filipe Vieira, então presidente do Benfica, e Paulo Gonçalves, na altura assessor jurídico da SAD do clube.
“O programa selecionou as mensagens que pudessem demonstrar que o presidente [da LPFP] alguma obediência ou subserviência ao Benfica. O que resulta das mensagens é precisamente o contrário, que o FC Porto dominou o mundo do futebol”, disse esta sexta-feira Mário Figueiredo, ao testemunhar no julgamento, em Lisboa, de Francisco J. Marques, Diogo Faria e Júlio Magalhães.
Citado como testemunha pelo Ministério Público, o ex-funcionário alega, por um lado, que os arguidos omitiram mensagens que mostram que Fernando Gomes, presidente da Federação Portuguesa de Futebol (FPF) desde Dezembro de 2011, apenas se candidatou a este órgão para defender os interesses do FC Porto, do qual foi treinador; e, por outro lado, que as mensagens que trocou com elementos do Benfica foram descontextualizadas, nomeadamente quando diz a Luís Filipe Vieira que está do seu lado.
Esta garantia, explicou Mário Figueiredo, referia-se à guerra então em curso com a Olivedesportos, pelos direitos de transmissão dos jogos dos clubes, e não ao processo da LPFP que estava pendente no presidente do Benfica para declarações contra a arbitragem. “Ele achava que estava sendo perseguido”, disse.
A versão da testemunha de acusação levantou dúvidas na defesa dos arguidos, que recordaram que Fernando Gomes ainda vai depor no julgamento.
“Sacerdotes”, “Missas” e “Rezai bem”
Durante a primeira parte da sessão, os defesas já tinham obrigado Adão Mendes, ex-árbitro e ex-observador da LPFP e da FPF, a explicar porque tinha falado em “padres” e “massas” numa troca de e-mails. , em 2014, com Pedro Guerra, na altura diretor de conteúdos da Benfica TV. Na mensagem, Adão Mendes disse ainda que é preciso “cantar e rezar bem”.
“Tenho muito respeito pelas missas, mas referia-me aos jogos de futebol”, afirmou Adão Mendes, acrescentando que “os padres são os árbitros”. Já “cantar e rezar bem” significava, segundo a tradução apresentada à quadra, “jogar bem e marcar mais gols”.
Dizendo-se “espantado” por se tratar de um código, o ex-árbitro explicou que a linguagem surgiu na década de 1990, quando os juízes não estavam autorizados a dizer, nem mesmo aos assistentes, qual jogo iriam arbitrar.
Questionado sobre porque, no final, pediu a Pedro Guerra que apagasse o e-mail, Adão Mendes esclareceu que apaga todos os seus e-mails. “Possivelmente, é ingenuidade, porque sei que isso não vale nada”, acrescentou o ex-árbitro, confirmando ainda que quando, na resposta, o seu interlocutor mencionou “o nosso primeiro-ministro” se referia a Luís Filipe Vieira.
Sobre os e-mails trocados, no mesmo ano, com Paulo Gonçalves, sublinhou que se destinavam apenas a pedir ajuda para dar seguimento aos recursos do filho, que tinha sido relegado a um nível arbitral. Pressionado pela defesa por pedir ajuda ao assessor jurídico do Benfica, salientou que não entendeu por que isso é estranho.
O julgamento prossegue a 13 de outubro no Tribunal Central Criminal de Lisboa.
Autor do parecer ERC é acionista do Benfica
O autor do parecer da Entidade Reguladora da Comunicação Social (ERC) que censurou a ação do Porto Canal admitiu, durante a sessão da tarde do julgamento, que é sócio e “accionista simbólico” do Benfica. Segundo a “Record” e o Porto Canal, o jurista reconheceu ainda que tem adereços das águias no seu gabinete no ERC, nomeadamente cartazes. O parecer, ainda em discussão nos tribunais administrativos, foi essencial para que o FC Porto e Francisco J. Marques fossem condenados pelo Tribunal da Relação do Porto a indemnizar o Benfica em um milhão de euros por danos não patrimoniais e 605 mil euros por danos emergentes . O clube vermelho exigiu cerca de 17 milhões. O processo é independente do que está a ser julgado em Lisboa.
vários crimes
Francisco J. Marques, 56 anos, Diogo Faria, 32 anos, e Júlio Magalhães, 59 anos e atualmente em outra estação, são responsáveis pelos crimes de violação de correspondência ou telecomunicações e ofensa a pessoa coletiva, entre outros. Se forem condenados, incorrem em pena de prisão ou multa.
“Interesse público”
Os advogados do Benfica consideraram, na primeira sessão do julgamento, que se trata da atuação dos arguidos e não do conteúdo dos emails. A defesa lembrou, no entanto, que o que está em jogo é o “interesse público” das mensagens que foram divulgadas e que mostraram a “podridão” do futebol.
Os réus em silêncio
Nenhum dos réus se pronunciou, até o momento, no julgamento, que começou em 16 de setembro deste ano de 2022. Isso não os impede, no entanto, de fazê-lo.
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