Abdelghani é um nome indissociável do futebol português, foi o rei do Egipto nos anos 80. Foi pelo Beira-Mar como Salah é hoje pelo Liverpool… vermelhos. O ex-meia-atacante de 63 anos continua sendo uma referência no país, uma voz com enorme prevalência e autoridade na esfera pública, mesmo em um momento em que reina a frustração entre os faraós, que não conseguiram acessar a Copa do Mundo.
Deixando de lado a tristeza atual, também refletida no distanciamento de Aveiro dos holofotes – o antigo craque de Aveiro, 117 jogos pelo Beira-Mar e 18 golos entre 1988 e 1992, é hoje o símbolo de uma geração no seu país. é presidente da Associação de Antigos Jogadores, não esconde a importância de Portugal na sua vida, ganhando destaque no continente africano e no Egipto, onde foi ídolo.
«Foi um jornalista francês que vivia no Cairo que me apresentou ao Beira-Mar. Ele queria me levar para a França, mas me falou dessa possibilidade de treinar para a experiência. Que era uma equipe forte que tinha acabado de surgir. Eu tive que jogar dois jogos para a experiência. Reservei os dois…Mas foi tudo estranho, ninguém me cumprimentou quando cheguei a Lisboa, fui a um hotel e recebi ligação para viajar no dia seguinte de St. Apolónia e seguir para o Hotel Imperial», conta.
“Também não tinham meu nome, tive que deixar meu cartão de crédito. Mas lá me informam para me apresentar no dia seguinte. Então eu jogo dois jogos, pontuo nos dois, cabe a você decidir. De volta ao Egito, faço escala em Paris e o empresário português Lucidio Ribeiro me coloca em um jogo entre Varzim e jogadores africanos. E é assim que assino um contrato», recorda, desenvolvendo o grau de afecto adquirido com o país que o acolheu.
cidade muito bonita
«Lembro-me muito de Portugal e nunca o esquecerei, porque consegui grande visibilidade e sucesso. Eu realmente me tornei bastante popular em seu país. Saí para as apostas desportivas, queria ser reconhecido na Europa e consegui», atesta o feiticeiro dos faraós, digno de um pedestal em África.
“Também ganhei financeiramente. No Egito não havia profissionalismo. Vim para ganhar bem, embora o Beira-Mar não tivesse muito dinheiro. O custo de vida era baixo em Portugal. Pedi um aumento após a primeira temporada e eles aceitaram. E até voltaram a melhorar o contrato depois do Mundial de 1990”, explica o sedutor maestro de um Beira-Mar que vivia uma fase de excelência.
«Foi uma experiência fantástica no campo e na cidade de Aveiro. Ele levou uma vida especial e pacífica em uma cidade muito bonita. Todos me conheciam e me cumprimentavam. Foi muito bom, um meio muito pequeno. Portugal era um destino de carreira incrível e o futebol africano estava começando a ter um grande impacto na indústria do futebol. Os jogadores mais bem sucedidos do continente alimentaram muitas expectativas”, acrescenta Abdelghani, encantado com o plantel que o acompanhou.
«O Beira-Mar era uma equipa repleta de grandes jogadores como Sousa, Dinis, Penteado, Jarbas ou Dino. Eram jogadores muito fortes e poderosos, lembro que foram escolhas feitas pelo presidente Silva Vieira. São muitas memórias inesquecíveis», atesta, focando alguns notáveis parceiros.
«O Dinis foi o mais divertido, brincou muito comigo. Eu zombava dele porque era um zagueiro forte, duro, mas sem técnica. Ele estava sempre chutando para a frente! O Sousa foi um grande jogador, foi ele quem marcou os livres. Mas fiz mais gols! Há ainda Simões, Jarbas, Dino…», revela ilustres aurinegros.
«Fizemos grandes jogos contra os grandes, o Mário Duarte teve um ambiente espetacular. Também não me esqueço do golo na final da Taça de Portugal frente ao FC Porto…Pena, claro, a derrota!», lamenta, voltando aos créditos que começou a ostentar com os seus jogos no Mundial de 1990.
Popularidade após Itália 90 na televisão portuguesa
“Depois de marcar aquele gol na Copa do Mundo de 1990 contra a Holanda e Van Breukelen, minha popularidade cresceu. Até disparou! Jamais poderei apagar da memória as imagens que vi da transmissão televisiva portuguesa. Foi repetidamente dito que parecia ter sido ‘o trabalho de nosso Abdelghani’. Portugal acolheu-me muito bem e reconheceu-me como um dos melhores estrangeiros», viaja para a glória suprema em campo, acompanhado de uns mimos preciosos para o ego.
“Cheguei aos 28 anos e me senti um bom jogador com grande capacidade de competir e dar o meu melhor. Ele também foi o primeiro jogador do Egito a viajar para outro continente. Isto foi em 1988. Depois veio Hossam Hassan… Houve outras vezes, nada comparável ao que está a acontecer hoje com Mo Salah», admite Abdelghani, lembrando-se apenas de ter vivido com um alegado interesse no Mónaco.
De cueca no frio de Viseu
Abdelghani já era um jogador experiente quando chegou a Portugal, vencedor de um CAN pelo Egipto em 1986, marcando a sua presença em 1984 nos Jogos Olímpicos de Los Angeles. Mesmo assim, ele se deparou com um contexto radicalmente diferente e uma comunicação muito complexa.
«No início da primeira temporada, eu ainda mal conhecia todo mundo, quase ninguém falava inglês, sei que marcaram um horário para sair do estádio de ônibus. Era assim às duas da tarde. Pensei que íamos dar um passeio, tomar um café. Acabamos em Viseu, entrámos num hotel e não percebi o que estava a fazer ali», diz.
«Falo com o Dinis, ele diz-me que lá íamos dormir. Não tinha trazido roupa e Viseu fazia muito frio à noite. Passei três noites lá, porque afinal era um torneio de pré-temporada e jogamos dois jogos. Fiquei no quarto com o Dinis e dormi de cueca. Eu não comprei nada. O time ganhou o torneio e eu fui eleito o melhor jogador. Sofri muito, mas fui recompensado”.
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