a ida à Disney com Herman, a participação em “Return to the Past” e o fim do “showbizz” – Observador

Quando se comemorou os 25 anos do Walt Disney Park em Orlando, EUA, Herman José foi convidado a participar junto com a equipe que produziu e dirigiu “A Roda da Sorte”. Transmitido diariamente ao final da tarde, o programa deixou Portugal colado ao ecrã: o apresentador estava numa fase profícua da sua carreira – foi por esta altura que nasceu “Parabéns” –, e a organização norte-americana convidou todos os anfitriões do nesse formato, transmitido em diferentes países do mundo. “Como não tínhamos muito dinheiro, acabei indo só eu e a Ruth”, conta o humorista ao Observador.

A essa altura, Ruth Rita (que morreu em 19 de outubro, aos 50 anos) era uma mulher de vinte e poucos anos, modelo e assistente do programa, que previa uma carreira de sucesso na televisão.

“Tínhamos adaptado o formato original para Portugal e foi a empresa de Carlos Cruz que lançou Ruth Rita na altura. Uma menina simples, educada, muito tímida, que rapidamente conquistou o carinho de todos que trabalhavam no programa. Ela havia pousado lá de pára-quedas”, diz Herman, lembrando o “instinto protetor” que toda a produção teve com a assistente. Nesta viagem aos EUA, os organizadores reservaram um andar inteiro do hotel, antecipando a chegada de uma generosa comitiva de Portugal.

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“Nós mantemos o andar inteiro para nós mesmos. E só usamos duas salas”, conta o comediante, lembrando os passeios em um ambiente que foi “um verdadeiro festival de talentos”.

Foi muito engraçado porque ela era muito dócil e ria muito das minhas bobagens. Passamos talvez mais de uma semana lá e nos divertimos muito. Eu sempre a empurrei muito e Ruth sempre foi tímida”.

Com um sorriso fácil e poucas palavras, Ruth conquistou facilmente o público da “Roda da Sorte” e participou num dos momentos mais desconcertantes da televisão portuguesa: o dia em que Herman destruiu os prémios e o cenário com uma espingarda.

Faleceu Ruth Rita, a conhecida assistente de Herman José no programa “Roda da Sorte”

Ela ficou fascinada. Tudo estava esperando por uma espingarda, mas esta era uma arma de guerra. Quando começou foi um caos total. Ela estava tão fascinada quanto o público – e até os seguranças. Foi absolutamente espontâneo e totalmente inconsciente que só poderia acontecer nos anos 90.. Estávamos convencidos de que éramos uma Suécia ou uma América. Imagine como seria hoje alguém entrar em um estúdio de televisão com uma arma”, lembra ela.

Em 1991, Júlio Isidro apresentou o programa “Regresso ao Passado” quando decidiu organizar um episódio dedicado ao teatro dos anos 20 e à revista portuguesa. Vários manequins foram convidados a representar as figuras icónicas da época, e foi nesta altura que a apresentadora de televisão conheceu Ruth Rita. “Lembro que fui uma eterna menina, desfilando ao lado de nomes como Ana Wilson ou Ana Bastos. Lembro-me até do vestido dela, um traje que tinha a ver com as mulheres do mar”, recorda a apresentadora de televisão, que sempre elogiou a postura com que Ruth se retirou do ecrã.

Foi uma escolha muito respeitável, ele preferiu se dedicar à família. Podia ter continuado, tinha imagem e talento, mas decidiu abrir uma loja de roupa.”

Desde então, no início dos anos 90, o manequim nunca mais se cruzou com Júlio Isidro. Mas a apresentadora ainda lembra das gravações daquele programa, em que Ruth “ensinava todo mundo a desfilar”. Ainda hoje, o apresentador guarda uma fotografia do manequim ao seu lado, vestido de Napoleão ou D’Artagnan, “se não me falha a memória”. “A decisão de Ruth de se afastar não é única. Quem não se lembra de Greta Garbo? Acontece com muita gente, uns são retirados, outros ficam na prateleira, outros caem no esquecimento. Todos são descartáveis”diz o apresentador de 77 anos de clássicos como “O Passeio dos Alegres” ou “Fever Saturday Morning”.

Herman, que passou aquela semana em Orlando com Ruth Rita, em entrevistas e recepções, lembra que depois de “Com a Verdade M’enganas” (outro formato híbrido, entre concurso e show de comédia), sua assistente decidiu se casar. “E foi assim que ele escolheu deixar o show biz. Ela percebeu que estava mais preocupada em ser mãe e ter uma família do que ser artista ou ter uma carreira na televisão.” A partir do momento em que decidiu abandonar a televisão, Ruth desapareceu completamente do espaço público. Ela nem deu entrevista. Diga-se Fernando Alvim, radialista, que tentou entrevistá-la para sua revista cultural, a 365.

“Tentamos durante muito tempo, porque na altura a revista saiu com muitas entrevistas a pessoas que tinham desaparecido da televisão”, diz a apresentadora, que foi várias vezes à loja da Ruth Rita, em Telheiras, sem sucesso.

A maioria das pessoas que fazem parte da show biz reféns, eles têm medo de serem irrelevantes”, acredita o humorista. “Quando você tem um trabalho com muita cobertura da mídia e você desaparece, as pessoas estranham, pensam imediatamente que algo está acontecendo. Se te virem na rua, vão dizer: ‘Então, você não foi lá, tem alguma coisa errada?’”.

Não foi o caso de Ruth Rita: na loja de Telheiras era costume receber amigos e clientes fiéis. Aos 50 anos, soube-se que o ex-manequim tinha câncer. Ficaram as memórias, partilhadas por dezenas de amigos, conhecidos e desconhecidos, nas redes sociais. Uma delas foi a apresentadora Tânia Ribas de Oliveira: “Conheci Ruth Rita quando nenhum de nós sonhava que um dia ela iria trabalhar na televisão. Fomos para a mesma escola, fomos à ginástica do Sporting e cruzamo-nos muitas vezes no nosso bairro, onde mais tarde ela abriu uma boutique. Rute era uma querida. Doce, com um sorriso sempre aberto, genuinamente querida. Ela ficou muito feliz em trabalhar com nosso Herman José.”

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