Até agosto deste ano, a Polícia Federal apreendeu 72 toneladas de cocaína no país. Em entrevista à Agência Brasil, o delegado federal Fabrício Martins, da Coordenação-Geral de Repressão a Drogas, Armas, Crimes contra o Patrimônio e Facções Criminais da PF, disse acreditar que este ano será alcançado um recorde nas apreensões de substâncias.
O recorde atual foi estabelecido em 2019, quando foram apreendidas 104 toneladas de cocaína. Em 2020 e 2021, o número ficou em torno de 90 toneladas. O valor inclui todas as apreensões feitas pela PF e outros órgãos públicos (como a Receita Federal e a Polícia Rodoviária Federal) que recolheram a droga e a entregaram à PF.
Martins ressalta, porém, que o combate ao narcotráfico não deve ser feito apenas pela apreensão de drogas. “A apreensão de drogas em si é eficiente? Não. No quadro de perdas da organização criminosa, já está computado o quanto perderá com as apreensões. A empresa vai continuar lucrando, porque o lucro é muito grande”, argumentou.
O delegado afirmou que, desde 2012, a Polícia Federal vem adotando outra abordagem: a descapitalização dos narcotraficantes e suas organizações. “Apreensões removem um ativo financeiro [da quadrilha] e também demonstrar que o dinheiro [que os traficantes têm] vem da droga. De lá, podemos apreender as mercadorias”, disse.
Segundo dados da Polícia Federal, nos últimos três anos, R$ 2,8 bilhões em bens de investigados por tráfico de drogas foram sequestrados ou apreendidos com autorização da Justiça em operações como a Empreendimento e o Rei do Crime.
“Hoje, você não pode fazer uma investigação sobre o tráfico de drogas sem investigar também a lavagem de dinheiro. Realizamos análises fiscais, bancárias e patrimoniais. Assim, podemos pedir bloqueio de contas, sequestro de mercadorias. Ao retirar a mercadoria, [o traficante] é impotente para agir. Buscamos desmantelar a organização por meio da descapitalização”, explicou.
Atacado
O delegado disse ainda que o Brasil é um país que faz fronteira com os três únicos maiores produtores de cocaína do mundo (Colômbia, Peru e Bolívia) e tem mais de 15 mil quilômetros de fronteira terrestre com seus vizinhos sul-americanos (incluindo produtores e Paraguai, que funciona como um armazém).
Portanto, o Brasil não é apenas um grande consumidor da droga, mas também um importante ponto de trânsito da cocaína destinada à África, Europa e Ásia.
Ele disse que o transporte de drogas entre países vizinhos e grandes cidades brasileiras (ou para o mercado consumidor internacional) não é necessariamente feito pelas próprias facções criminosas.
Existem muitos esquemas envolvendo atacadistas independentes que veem organizações como o Primeiro Comando da Capital (PCC) e o Comando Vermelho apenas como revendedores de seus produtos.
“Essas pessoas não pertencem às facções. Eles têm logística pronta e são grandes fornecedores de medicamentos. Essas pessoas são consideradas empreendedoras e não possuem cunho criminoso. [como os integrantes das facções criminosas]”, apontou.
A logística, acrescentou Martins, envolve a busca da droga nos quatro vizinhos (os produtores e o Paraguai) por diversos meios, como barcos que navegam pelos rios amazônicos, pequenos aviões que pousam em pistas clandestinas (principalmente em Rondônia, Mato Grosso e Mato Grosso do Sul) e veículos rodoviários que atravessam a fronteira.
De lá as drogas são levadas para os grandes centros do país. Parte da carga é revendida nas próprias cidades por facções criminosas. Mas boa parte é enviada para o exterior, principalmente por via marítima. Mais de 50% da cocaína apreendida no ano passado estava nos portos brasileiros.
Lucro
Ainda de acordo com o delegado, a exportação se mostrou bastante lucrativa. Um quilo de cocaína seria comprado a US$ 2.500 (cerca de R$ 13.000) na fronteira do Brasil com seus vizinhos sul-americanos e revendido por quatro vezes esse valor (US$ 10.000) nas grandes cidades do país. Se a carga chegar à Europa, porém, pode render de 30 a 40 mil euros (aproximadamente o mesmo valor em dólares no câmbio atual), ou seja, até quatro vezes mais.
O Porto de Santos (SP) é reconhecido pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (Unodc) como um dos principais pontos de trânsito de cocaína do mundo. E os portos do Norte e Nordeste foram identificados como novos pontos de envio da droga para o exterior. “Houve um aumento no uso de veleiros e barcos de pesca [para o transporte de cocaína] no norte do país. Em apenas um veleiro foram apreendidas seis toneladas”, concluiu Martins.
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