
Imagem: Unsplash/Reprodução
Texto: André Julião, da Agência FAPESP
Estudar Publicados na revista Avanços da ciência descreveram, pela primeira vez, um circuito neuromuscular que liga a queima de gordura no músculo à ação de uma proteína no cérebro.
Os resultados, obtidos por pesquisadores da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) e da Universidade de São Paulo (USP), ajudam a entender como a prática de exercícios físicos auxilia na perda de peso e reforçam a importância desse hábito para a saúde.
“O trabalho teve como objetivo estudar a ação de uma proteína chamada interleucina 6 [IL-6], que tem característica inflamatória, mas que em algumas situações, como o exercício físico, assume diferentes funções. Neste caso, a queima de gordura no músculo”, explica Eduardo Ropelleprofessor da Faculdade de Ciências Aplicadas (FCA) da Unicamp, em Limeira, que coordenou o estudo suportado pela FAPESP.
O grupo liderado pelo pesquisador já havia observado que camundongos que tiveram a proteína injetada diretamente no cérebro iniciaram imediatamente um processo de oxidação da gordura no músculo da pata. Esta parte do estudo foi realizada durante o mestrado em Thayana Micheletti, Bolsa de estudo da FAPESP.
Micheletti realizou parte da análise durante Estágio na Universidade de Santiago de Compostela, Espanha.
Com os resultados, os pesquisadores buscaram entender se havia um circuito que ligasse a produção de IL-6 no hipotálamo, parte do cérebro que controla diversas funções, com a quebra de gordura observada no tecido musculoesquelético.
Esta etapa da pesquisa contou com o apoio de Carlos Katashimaque atualmente realiza estágio de pós-doutorado no Laboratório de Biologia Molecular do Exercício (LaBMEx) da FCA-Unicamp, coordenado por Ropelle.
Estudos anteriores indicavam que uma parte específica do hipotálamo, a porção ventromedial, poderia alterar o metabolismo muscular quando estimulada. Ao detectar a presença do receptor de IL-6 nessa parte do cérebro, pesquisadores brasileiros chegaram à hipótese de que a ação da proteína ali produzida poderia desencadear um circuito neuromuscular, favorecendo a queima de gordura no tecido musculoesquelético.
Para demonstrar a existência do circuito, vários experimentos foram realizados. Em um deles, Katashima e colegas cortaram o nervo ciático, que conecta a coluna ao músculo da coxa, em apenas uma das patas dos camundongos.
Quando a IL-6 foi injetada no cérebro, a queima de gordura ocorreu como esperado na pata intacta, mas não na que teve o nervo cortado. “O experimento mostrou, portanto, que a queima de gordura muscular só ocorre graças à conexão nervosa entre o hipotálamo e o músculo”, diz Katashima.

Receptores bloqueados
Restava aos pesquisadores descobrir como essa conexão entre os sistemas nervoso e muscular era feita. Para isso, administraram aos camundongos medicamentos que bloqueiam os chamados receptores alfa e beta adrenérgicos, neste caso responsáveis por receber o sinal nervoso para que o músculo possa desempenhar a função determinada pelo cérebro.
Embora o bloqueio dos receptores beta não tenha sido tão eficaz, “desligar” os receptores alfa adrenérgicos fez com que a oxidação da gordura no músculo fosse bastante reduzida ou não.
Análises computacionais (in silico) mostraram uma forte correlação entre o gene IL-6 no hipotálamo e duas subunidades de receptores alfa no músculo, alfa2A e alfa2C. Os resultados foram validados quando os pesquisadores injetaram IL-6 no cérebro de camundongos que não produzem esses receptores específicos e os animais não apresentaram qualquer quebra de gordura no músculo.
“Um achado importante desse estudo foi ter associado esse circuito neuromuscular ao chamado afterburn, que é a queima de gordura que acontece depois que paramos de se exercitar. Isso já foi considerado secundário, mas na verdade pode durar horas e deve ser considerado de fundamental importância no processo de emagrecimento”, destaca Ropelle.
“Mostramos que o exercício físico, além de produzir IL-6 no músculo, como já se sabia, também aumenta o conteúdo dessa proteína no hipotálamo. Portanto, os efeitos provavelmente serão muito mais duradouros do que apenas durante a atividade em si. Isso mostra mais uma vez a importância do exercício físico na intervenção contra a obesidade”, conclui Katashima.
O trabalho também contou com o apoio da FAPESP por meio de um Projeto Temáticocoordenado por Adelino Sanchez Ramos da Silva.
O artigo Evidência de um circuito neuromuscular envolvendo a interleucina-6 hipotalâmica no controle do metabolismo do músculo esquelético pode ser lido em: www.science.org/doi/10.1126/sciadv.abm7355.
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