UMA sarcopenia – uma condição caracterizada pela perda de força, massa e função muscular – é um fenômeno definidor do envelhecimento. Seu diagnóstico precoce é extremamente importante e começa pela medição da força das mãos com um aparelho chamado dinamômetro.
Pesquisadores da UFSCar (Universidade Federal de São Carlos), em parceria com colegas da University College London (UCL, Reino Unido), estão sugerindo a alteração do protocolo de diagnóstico.
A proposta é aumentar o valor mínimo da força palmar considerada normal. Dessa forma, acreditam, seria possível diagnosticar a doença com mais precisão e detectar precocemente o risco de morte no idoso.
Para sugerir os novos valores, a equipe comparou todos os pontos de corte propostos em estudos anteriores sobre o tema. O trabalho envolveu a análise de um banco de dados de 6.182 britânicos com 60 anos ou mais acompanhados por 14 anos como parte do English Longitudinal Study of Aging (ELSA), um estudo longitudinal realizado na Inglaterra. A pesquisa foi financiada pela FAPESP (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) e os resultados divulgados Revista Idade e Envelhecimento.
De acordo com o último consenso europeu, publicado em 2019, a sarcopenia foi diagnosticada quando a força de preensão manual era inferior a 27 kg (kg) para homens e inferior a 16 kg para mulheres. Os autores do artigo sugerem que esses valores sejam aumentados para menos de 36 kg para homens e menos de 23 kg para mulheres.
“Observamos que quando se utilizam escores de corte mais baixos, o resultado não serve para indicar o risco de mortalidade. E a ideia desses novos valores de referência é detectar o risco de morte o mais cedo possível. Quando isso aparece tardiamente, torna-se muito difícil fazer intervenções, como mudanças na dieta e a indicação de exercícios de força resistidos. Por isso é tão importante que nossa sugestão seja aceita pela comunidade científica e se torne um novo consenso para o diagnóstico da sarcopenia”, defende Tiago da Silva Alexandre, professor do Departamento de Gerontologia da UFSCar e professor visitante da UCL.
No estudo, os pesquisadores afirmam que, embora os pontos de corte mais baixos estejam em vigor desde 2019, eles sempre foram questionados pela comunidade acadêmica. “Outros estudos já haviam mostrado problemas na forma de diagnosticar a sarcopenia. No entanto, fomos os primeiros a apresentar escores de corte capazes de indicar o risco de morte relacionado à doença e compará-los com os já utilizados”, diz.
A partir dessa comparação, os pesquisadores conseguiram entender por que o consenso de 2019 não estava funcionando tão bem.
“Além de não poder indicar o risco de morte, a forma como a sarcopenia está sendo diagnosticada subestima a prevalência da doença. Demonstramos que quando os pontos de corte eram mais baixos, a velocidade de caminhada acabou sendo uma métrica melhor para avaliar o risco de morte. No entanto, esse indicador capta apenas casos avançados de sarcopenia, quando a prevenção pode não ser mais possível”, diz Maria Claudia Bernardes Spexoto, professora da Faculdade de Ciências da Saúde da Universidade Federal da Grande Dourados (UFGD) e primeira autora do artigo.
Conforme explicam os pesquisadores, a perda de força, massa e função muscular vai além de questões relacionadas à locomoção, autonomia ou risco de queda em idosos. “O músculo está associado a funções mais amplas do que a contração e a geração de força. Ela participa do processo imunológico e endócrino, no controle de algumas infecções pelo sistema imunológico, e também auxilia no controle da glicemia”, diz Alexandre.
Por isso, a pesquisadora justifica a necessidade de monitorar não só a quantidade de músculo preservada nos idosos, mas também a qualidade. “O sistema musculoesquelético participa de vários outros sistemas do organismo. Se o idoso tiver uma boa quantidade e qualidade de músculo, a velhice será mais tranquila. Não tenha dúvidas”, diz o pesquisador.
Risco de morte
De acordo com os resultados do novo estudo, idosos com “provável sarcopenia” (uma condição que precede a doença) tiveram um risco de morte 30% maior do que pessoas não sarcopênicas. Idosos com sarcopenia confirmada tiveram risco 48% maior e aqueles com sarcopenia grave, 78%.
Vale ressaltar que a pesquisa considerou dados de mortalidade geral e o risco foi maior independentemente de fatores como idade, tabagismo, consumo de álcool, estado civil, nível de atividade física, circunferência abdominal aumentada, presença de doença cardiovascular, diabetes, hipertensão, câncer , doença pulmonar, número de quedas no último ano, uso de medicamentos, sintomas depressivos e desempenho de memória.
Segundo Alexandre, a dificuldade em detectar o risco de morte a partir de pontos de corte mais baixos pode ser explicada pelo tempo de acompanhamento dos estudos. Enquanto trabalhos anteriores acompanharam os idosos por no máximo seis anos, os pesquisadores da UFSCar e UCL fizeram isso por 14 anos.
“Estudos que propuseram escores de corte mais baixos não avaliaram risco de morte ou tiveram períodos de acompanhamento muito curtos, distorcendo os resultados encontrados. Obviamente, indivíduos com menor força morrem mais rápido, impedindo que aqueles que estavam em risco a médio e longo prazo também sejam identificados com precisão”, explica o pesquisador.
Isso porque a perda de força, massa e função muscular não é algo que acontece da noite para o dia. Ocorre em um longo processo que dura anos. “A história natural da doença é que ela acontece lentamente, dia após dia”, diz ele.
prevalência subestimada
O impacto dos novos pontos de corte propostos pelos pesquisadores da UFSCar e UCL é grande. Deve afetar, entre outros fatores, as estatísticas sobre a prevalência da doença na sociedade.
“Com pontos de corte mais altos, as taxas de prevalência da doença aumentam e mais pessoas precisarão ser rastreadas. Com isso, será possível identificar a sarcopenia muito antes que a condição represente risco de morte”, diz Alexandre.
Segundo o pesquisador, os dois últimos consensos europeus para o diagnóstico de sarcopenia apresentam pouca concordância, o que acaba gerando discrepâncias nos dados de prevalência, que variam de 11% a 27,7% quando se aplica um consenso e de 4,6 a 13,6% para o outro.
Quando os pesquisadores usaram os novos escores de corte (menos de 36 kg e 23 kg), a prevalência saltou para 33,9% de sarcopenia provável, 6,2% de sarcopenia confirmada e 8,6% de sarcopenia grave.
“É uma alta prevalência para uma condição que, quando diagnosticada e tratada a tempo, pode ser contornada para melhorar a qualidade de vida dos idosos e prevenir a mortalidade precoce. Com base nos pontos de corte sugeridos pelo estudo, iniciaremos uma nova pesquisa para medir a prevalência de sarcopenia na população idosa brasileira”, disse.
nova métrica
No artigo publicado na revista Age and Aging, os autores também descrevem uma nova estratégia para detectar sarcopenia sem medir a força de preensão manual: avaliar a velocidade de caminhada. Esse é outro indicador importante relacionado à velhice (leia mais em: agencia.fapesp.br/37887/).
“No entanto, a velocidade da caminhada já é um resultado. Os idosos só apresentarão lentidão [velocidade menor ou igual a 0,8 metro por segundo] quando já está enfraquecido. Com os novos escores de corte para o diagnóstico de sarcopenia, conseguimos ter um preditor precoce do risco de morte. Algo essencial para a clínica”, diz Alexandre.
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