Costuma-se dizer que em toda crise há também uma oportunidade. E o que estamos vivenciando – com a guerra na Ucrânia, inflação crescente, suprimento limitado de energia e alimentos – não é exceção. Se você tem dinheiro para investir, agora existem áreas mais atraentes. E outros investimentos que, apesar de parecerem os corretos, precisam ser analisados de outra perspectiva
Antes de se dedicar à leitura das pistas deste artigo, atenha-se a este lema: o processo de investimento é sempre personalizado e é fundamental que você busque conselhos de especialistas e reúna o máximo de informações possível antes de largar o dinheiro. O conselho vem dos especialistas com quem a CNN Portugal falou. Um investimento que faz sentido para você pode não fazer sentido para o seu vizinho.
Os combustíveis aumentam. Devo comprar ações de petróleo?
O preço do combustível vem subindo. Mas é certo, portanto, investir em uma empresa de petróleo? João Sousa, especialista em assuntos financeiros da Deco Proteste, lembra que os mercados accionistas têm assistido a fortes oscilações. Mas, “nem tudo está desmoronando”, diz ele. Em todo o mundo, as ações das empresas petrolíferas subiram 36%. Os títulos das empresas do setor de defesa, acrescenta, subiram quase 32%. No mercado farmacêutico, 4%. Setores como esses poderiam dar maior estabilidade a quem investe. Mas fica a ressalva: o investimento deve ser feito com uma perspectiva de longo prazo, de cinco a 10 anos, dando tempo para o mercado se recuperar. “E é preciso aceitar que a viagem, num futuro próximo, pode ser muito difícil”, enfatiza o economista. Deco Proteste, por exemplo, tem um comparador onde identifica as ações das empresas onde a compra é recomendada.
Preços subindo e muita procura. É um bom momento para investir em imóveis?
Se as taxas de juros das hipotecas estiverem subindo, é certo que os preços das casas continuarão seguindo a mesma tendência. no grande centros urbanos há mais demanda do que oferta. Assim, investir dinheiro em imóveis, nesta fase, pode parecer interessante para quem tem dinheiro de lado – até para evitar que o contexto piore ainda mais. Mas se o setor imobiliário costuma ser visto como um investimento seguro, é hora de desconstruir essa ideia. “A questão do imóvel parecer um investimento seguro é um mito. Os preços variam muito”, insiste João Sousa. O investimento em imóveis, ressaltam os especialistas, deve ser feito caso a caso. Você precisa estar ciente de que, com as perspectivas de recessão e a esperada desaceleração do mercado, o contexto pode ter impacto no valor da casa que você compra. A casa, na verdade, corre o risco de valer menos quando você precisa se livrar dela. Por isso, fica aqui um conselho de Filipe Garcia, presidente do IMF – Informação de Mercados Financeiros, que vale para investimentos nas mais variadas compras: “Há muito foco no momento da compra, mas pouco se fala sobre o momento da venda”. Para tomar as decisões certas, você tem que pensar sobre isso.
Os certificados de poupança são mais atraentes. Mas por que?
São um dos investimentos mais unânimes nesta fase. Primeiro, porque estão indexados à Euribor, o que permite antecipar que o retorno do seu investimento continuará a aumentar num futuro próximo. Em segundo lugar, porque tendo garantias estatais, não há riscos. E eles têm uma rentabilidade que pode chegar a 3,5% no ano que vem, um valor muito superior aos depósitos em bancosonde o retorno é praticamente zero.
O luxo é atemporal. Mas faz sentido investir?
Em tempos de crise, há quem veja bolsas, relógios ou arte como um bom investimento. Mas ele permitirá um retorno interessante, caso haja necessidade? “Esses bens têm várias dificuldades adicionais. A primeira é que, regra geral, não existe um mercado organizado para a sua comercialização”, salienta Filipe Garcia. Ou seja, o bem valerá o que o comprador estiver disposto a pagar. Em última análise, dependerá da sua percepção de preço. Então você tem que levar em conta que, para vender por um preço mais alto do que comprou, pode ter que esperar muitos anos. O luxo também é feito de tempo – e da crescente raridade que ele cria. “É um mercado que exige conhecimentos muito específicos. É mais dedicado aos especialistas”, resume João Sousa.
O ouro é um ativo porto seguro. É uma boa opção?
O ouro é considerado um ativo porto seguro e, em contextos de instabilidade de mercado, tende a ser muito procurado. E depois os preços a apreciar. É por isso que um dos maiores investidores do mundo, Warren Buffett, já veio desaconselhar o investimento neste metal precioso. Então, onde estamos? É sempre uma questão de perspectiva. “O ouro em dólares está a cair 7,5% este ano, em euros está a ganhar 8%”, contextualiza Filipe Garcia. Mas se esse ativo pode ser lucrativo, saiba que ele não rende nada junto. A Deco Proteste aconselha a não investir mais de 5% dos seus investimentos em ouro. E, se quiser fazer, não faça em formato físico, por exemplo, indo a ourives comprar ouro, porque “há uma diferença entre os preços de venda e de compra. O melhor veículo para investir noutra, diz João Sousa, é através de um ETF, ou seja, um fundo dedicado a esta área.
Há uma crise energética aí. É hora de vencer com energia verde?
É no campo do empreendedorismo que começamos a ver, mesmo num contexto instável, quais os melhores negócios para investir. Nesta fase, afirma Diogo Teixeira, cofundador da Beta-i, uma das áreas com o maior potencial é a energia renovável. Até porque, com os problemas que se têm registado no abastecimento de gás e combustível, à custa da guerra na Ucrânia, são cada vez mais urgentes os desígnios de transição energética e descarbonização. “Serão negócios mais resilientes, serão uma boa oportunidade para os investidores”, resume. Então, se você deseja abrir um negócio ou apenas investir, esse pode ser o caminho a percorrer. Desenvolvimento de baterias, métodos de carregamento rápido, desenvolvimento de matérias-primas (como têxteis) com menor pegada de carbono são alguns dos exemplos.
A comida é mais cara. Investir na agricultura é um caminho?
O abastecimento de alimentos foi interrompido pela guerra na Ucrânia e os preços dispararam com a inflação, deixando muitas famílias lutando para cumprir o orçamento. Então, faria sentido apostar em seus próprios projetos agrícolas? Diogo Teixeira acredita que sim, pelo impacto da descarbonização pelo maior consumo local e pela maior perspectiva de controle de preços. “É certamente uma área de investimento estratégico, de médio prazo”, alerta o porta-voz da consultoria de inovação colaborativa. Mas, mais uma vez, é preciso estar atento ao contexto: no ano que vem, as famílias podem ter que economizar ainda mais na alimentação. Então, se a perspectiva de investimento é de curto prazo, é melhor pensar em outra alternativa, diz.
Não há muito dinheiro para administrar. E se algo quebrar, pode haver negócios?
Os orçamentos estão cada vez mais apertados. E se um eletrodoméstico quebrar em casa, substituí-lo por um novo pode não ser uma decisão tão fácil de tomar. Em contextos de crise, um dos negócios que pode prosperar é precisamente: a reparação de bens, bem como serviços de canalização ou electricista, que permitem soluções mais económicas do que a substituição ou um trabalho mais aprofundado. “Há uma enorme carência no mercado deste tipo de profissionais”, reconhece Diogo Teixeira, lembrando que “não é por acaso que algumas das principais empresas do país lançaram plataformas de ‘marketplace’ [com anúncios] deste tipo de serviço”. Para quem busca um futuro profissional, essa pode ser uma alternativa. Até porque a tecnologia acaba aliviando alguns dos incômodos do passado, como ter que ir de porta em porta para atrair clientes. Por parte de quem não tem competências para os arranjos mas para investir, as plataformas digitais podem ser um mercado a explorar. “Os portugueses, cada vez mais, devem procurar negócios digitais ou escaláveis, mais do que apenas negócios sujeitos a crises e à lei da oferta e da procura. Como trabalham para o mundo inteiro, têm maior resiliência”, resume o cofundador da Beta-i.
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