Cirurgiões pediátricos e urologistas alertaram para um aumento testículos em adolescentes ou adultos jovens, problema que pode levar à perda do órgão que tem a função de produzir hormônios masculinos, como testosterona e esperma.
Em nota recente, a Associação Brasileira de Cirurgia Pediátrica expressa sua preocupação com a alta e relata situações frequentes em que jovens chegam ao pronto-socorro com um testículo “morto” que precisa ser extirpado atraso no diagnóstico e cirurgia que reverte o problema.
“Não podemos demorar muito para levar a criança ao pronto-socorro. Em casos como esse, não é bom esperar o dia raiar ou dar um analgésico e esperar uma melhora para procurar atendimento”, diz a nota de a entidade.
Segundo o cirurgião pediátrico Sylvio Ávila, do Hospital Pequeno Príncipe, em Curitiba (PR), a cada ano há uma expectativa de número de casos, mas nas últimas semanas o número disparou, principalmente no sul do país.
“Há hospitais que têm dois ou três casos por dia. Ainda ontem [na última terça, 27], tivemos dois casos. É muito testículo torcido, nunca vi essa quantidade”, diz Ávila.
Não há dados nacionais atualizados sobre o aumento da ocorrência. Um estudo de 2010 estimou que há pelo menos 1.000 entorses por ano no país. No Pequeno Príncipe, o número de casos do início do ano até esta quinta-feira (29) já havia superado todo o ano passado —49 contra 41.
A suspeita é que o aumento esteja relacionado às baixas temperaturas, situação que favorece a torção testicular em jovens que têm um “defeito” anatômico na fixação dos testículos ao escroto.
No frio, os testículos se movimentam mais e há maior risco de que girem em seu eixo, causando torção. Quando isso acontece, há um fechamento dos vasos sanguíneos que nutrem o órgão, causando um “infarto” por falta de oxigênio. Se não for distorcido no tempo, “morre” e precisa ser extirpado.
“Quando está frio, o músculo cremaster [que se insere no escroto e age suspendendo o testículo] contrai e aproxima o testículo do corpo. Quando está calor, relaxa e o testículo desce”, explica o urologista Roni Fernandes, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Urologia.
“A frente fria vem e, nos dias seguintes, os casos começam a chegar”, relata o urologista Marcos Broglio, que trabalha na Santa Casa de São Paulo. Este ano, a instituição tratou pelo menos 28 casos de entorse.
Segundo os médicos, não há como prever ou diagnosticar o problema precocemente. A torção testicular acontece de forma aguda e repentina, causando dor muito intensa, muitas vezes acompanhada de náuseas ou vômitos e dor abdominal.
Eles reforçam que, diante da dor aguda na região, o menino precisa ser levado imediatamente para um hospital para ser operado, pois há um prazo para que o testículo seja salvo. Até seis horas após a torção, as chances de manter o órgão são superiores a 90%. Se demorar 12 horas, eles caem para 50%, e com 24 horas de atraso, 90% perdem o testículo.
Um dos fatores que contribuem para a demora na procura de ajuda médica é a vergonha que os adolescentes têm de relatar aos pais que têm dor nos testículos. “Como desconhecem o problema, acham que pode ser alguma bobagem que fizeram [masturbação] e não conte aos pais. Alguns meninos relatam que sentiram dor após ereções noturnas com sonhos eróticos”, diz o cirurgião Ávila.
De acordo com Broglio, 80% dos casos ocorrem entre as idades de 9 e 20 anos, e as circunstâncias em que ocorrem as entorses variam muito. Estes incluem atividade física intensa e pequenos inchaços no testículo. “Na metade dos casos que vejo, eles dizem [a torção] acontece à noite, dormindo.”
Foi o que aconteceu com um adolescente de 14 anos de Curitiba na última terça-feira (27). A mãe, que pediu para não ser identificada para não expor o filho, conta que o menino acordou com muita dor no testículo às 6h30 e pediu ajuda aos pais. Uma hora depois, eles já estavam na sala de emergência do hospital.
Segundo ela, ao buscar atendimento rápido, foi possível recolocar o testículo no lugar e consertá-lo para evitar uma nova torção. Sua mãe relata que nunca tinha ouvido falar que isso pudesse acontecer durante o sono.
Roni Fernandes, da SBU, lembra que a torção também pode ocorrer durante a ejaculação porque o músculo se movimenta. “Mas pode acontecer em muitas circunstâncias. Por exemplo, o menino está com os amigos e pula em uma piscina gelada. Se o testículo não estiver bem fixado, ele pode torcer.”
Outro grande obstáculo que impede a cirurgia a tempo de salvar o testículo torcido é demora no acesso aos hospitais públicos. O paciente precisa procurar uma unidade de saúde, que acionará o sistema de regulação de leitos, que buscará na rede um local com capacidade cirúrgica. Isso geralmente leva mais de 20 horas.
“Às vezes, alguns serviços ainda acabam transferindo o paciente para outros locais onde têm urologistas, o que atrasa ainda mais a cirurgia. Não há necessidade disso, um cirurgião geral pode abordar o caso”, diz Broglio.
Na opinião de Roni Fernandes, embora seja uma cirurgia de baixa complexidade, que pode ser realizada em qualquer hospital, é preciso que os pacientes, os pais, o sistema regulador e os hospitais entendam a urgência do caso. “Você ainda tem que passar por apendicite.”
Ele afirma que em 60% dos casos essa malformação testicular é bilateral. Ou seja, quando um testículo torce e é operado, o outro testículo saudável também precisa ser consertado preventivamente para que não torça no futuro. “Já recebemos dois pacientes onde isso não foi feito e eles perderam o segundo também.”
Mesmo com um testículo, o homem preserva a fertilidade e a produção de hormônios, mas se perder ambos, torna-se infértil e sem hormônios masculinos, o que levará à perda muscular e óssea e ao desempenho sexual prejudicado.
“A consequência mais grave é a estética, isso pesa muito na autoestima dos homens. Infelizmente, o SUS não oferece prótese testicular. Somente pacientes particulares e conveniados têm esse benefício”, diz Sylvio Ávila, do Hospital Pequeno Príncipe.
Leave a Reply