“Queremos voltar à prática médica, colocar as mãos nela e perceber o paciente como um todo”

Até o dia 6 de setembro, Campo Grande sediará o 33º Congresso Brasileiro de Homeopatia, com a participação de profissionais nacionais e internacionais que tratarão da homeopatia à ginecologia no SUS e nas urgências/emergências. Nesta entrevista, o vice-presidente regional da Associação Médica Homeopática Brasileira fala sobre o evento e esclarece algumas questões relacionadas a esta especialidade médica, com base na lei dos similares.

PERGUNTA POR CORREIO
Primeiramente, gostaria que você defina para o leitor o que é homeopatia.
LUIZ DARCY –
A homeopatia é uma especialidade médica, como qualquer outra, uma terapia baseada na lei dos semelhantes. Ou seja, “hómoios”, vem do grego e significa semelhante, e “pathos”, que significa sofrimento. A homeopatia busca identificar o sofrimento do paciente, aquele que é mais característico de seu sofrimento, com uma substância que foi previamente experimentada em um homem sadio ou capturada pelos sintomas por intoxicação acidental ou não. Isso é criado no que chamamos de matéria médica homeopática. Esta matéria médica contém todas as substâncias com os sintomas que produziu naquele experimento. E quando encontramos um casamento desses sintomas com o sofrimento do paciente, esse é o remédio. E como funciona? O remédio, por não ter nenhum princípio ativo químico que atue no nível celular ou molecular, como os remédios químicos convencionais, é um estímulo, é uma informação, de fato, para colocar em operação um sistema natural de autocura que já conhecemos. tenho. Então, o criador da homeopatia, Samuel Hanhemann, lá no século 16, queria algo que ele tivesse na natureza e que produzisse essa informação. Em outras palavras, devolver o paciente ao estado original de saúde, que é prejudicado por doenças. É isso que o estímulo faz, faz o paciente perceber sua doença.

Você preside o 33º Congresso Brasileiro de Homeopatia, que acontecerá em Campo Grande até o dia 6 de setembro. Em linhas gerais, o que será discutido entre os médicos neste evento?
O programa foi elaborado pela comissão organizadora do congresso e esse grupo estudou e pensou em resgatar, dentro da própria homeopatia, o que chamamos de tema principal do congresso, a prática médica, ou seja, colocar a mão no paciente, voltar as origens do exame no paciente, para examinar e perceber o paciente em sua totalidade. Hoje a gente fica muito dependente dos resultados, diagnósticos, exames, exames de imagem e tal e a gente coloca pouca mão no paciente, a gente examina pouco. Dentro da homeopatia, queremos resgatar isso também para nossos colegas mais novos, no sentido de dar importância à entrevista, à anamnese, para conhecer o paciente. Todas as palestras, mesas redondas e conferências foram pensadas em torno deste tema central. Também vamos trabalhar a questão do ensino da homeopatia, das escolas de formação, da homeopatia na saúde pública, como é a contribuição da homeopatia, hoje, dentro do Sistema Único de Saúde, a questão da homeopatia nas especialidades – a maioria dos homeopatas são pediatras ou clínicas, mas também tem otorrinolaringologistas, oftalmologistas, ginecologistas. E junto com este congresso, teremos o 1º Congresso de Atualização em Veterinária Homeopática e a Odontologia também realizará seu 13º Congresso Brasileiro de Odontologia Homeopática.

Qual é a diferença entre alopatia e homeopatia?
É basicamente o foco. Na alopatia, estamos mais preocupados com a doença. Os exames são realizados no paciente para fazer um diagnóstico, dar um rótulo a alguma doença. E quando fazemos o diagnóstico, já existe um protocolo de tratamento para aquela doença. Na homeopatia também fazemos isso, é importante saber o diagnóstico do que está sendo tratado. Mas aí a gente vai para outro caminho, que é entender porque a pessoa tem aquela doença, o que fez acontecer, porque nada no corpo acontece do nada, por acaso.

Tal como acontece com a alopatia, houve descobertas significativas na homeopatia nos últimos anos que revolucionaram de alguma forma qualquer tratamento?
Não, porque os medicamentos – e isso é algo muito interessante – são os mesmos de 220 anos atrás. Há ensaios de novos medicamentos, mas para tratar sempre as mesmas coisas. Não existe um novo remédio para uma nova doença, não isso. O que vem acontecendo hoje, que chamamos de contribuição dos homeopatas contemporâneos, é que, usando a homeopatia clássica de Samuel Hanhemann e dos autores antigos, surgem novas abordagens para acessar o paciente, filtrar, obter, por meio de alguns métodos, encontrar o medicação do paciente de forma mais fácil.

Antigamente, pais e mães davam remédios caseiros para seus filhos. Chá de sabugueiro, alho, por exemplo, sempre foram opções para a gripe. Hoje é mais comum dar remédio. Por que você acha que esses costumes foram perdidos?
Primeiro, pelo próprio desenvolvimento da medicina e dos medicamentos. Antigamente, as pessoas não tinham muito acesso a medicamentos porque a indústria não era o que é hoje. E a indústria é uma empresa e quer vender seu produto, faz marketing, e é tão forte na mídia que as pessoas acabam acreditando que esse é o jeito certo de fazer as coisas. E o que aconteceu com as pessoas? O imediatismo que vem com a nossa transformação cultural. As pessoas querem estar doentes de manhã e estar bem à tarde.

Qual é o dano a longo prazo de administrar muitos remédios químicos desde tenra idade?
Todo fármaco químico, além do efeito terapêutico desejado, apresenta resultados adversos e colaterais, que vão depender da sensibilidade de cada paciente. E, a longo prazo, acontecerá o que chamamos de doença crônica dos medicamentos. Ou seja, pacientes que tomam medicamentos por um período de tempo muito longo não podem retirar esses medicamentos sob o risco de ter um efeito rebote muito grave. Em outras palavras, se a pessoa toma um medicamento, por exemplo, um hipertensivo, anticonvulsivante e outros medicamentos muito crônicos, como antidepressivos, se parar de repente, sua doença pode piorar muito gravemente. Portanto, temos que ter muito cuidado com os pacientes que estão em tratamento crônico, para que nunca retiremos a medicação abruptamente. Os colegas especialistas sabem disso.

E ao contrário, quais são os riscos de administrar ervas e produtos caseiros sem orientação?
Quando falamos de ervas e produtos caseiros, estamos falando de fitoterapia e isso não é homeopatia. A fitoterapia é a mesma que a alopatia, só que com efeito mais suave, mas não menos tóxica. A vantagem da fitoterapia é que o princípio ativo está em conjunto com o que chamamos de substâncias coadjuvantes, que já tratam os efeitos colaterais. Quando purificamos uma substância para ter um remédio químico, ela é pura, não tem essas substâncias que ajudariam nos efeitos adversos. Portanto, quanto mais potente uma droga, mais efeitos adversos ela tem. E é por isso que as plantas, a fitoterapia, têm menos efeitos adversos, mas não deixam de tê-los. Quem faz fitoterapia deve ter conhecimento, pois nem toda planta pode ser fervida, pode ser infundida, etc.

Algumas pessoas associam a homeopatia ao efeito placebo. Porque?
Para poder extrair do paciente os sintomas mais característicos dele, que se combinam com uma substância, muitos pensam que a consulta é como a de um psicólogo, como a de um terapeuta. Em nossa consulta, os sintomas mentais são altamente valorizados, além dos gerais e físicos. E muita gente, de fato, melhora só com a consulta, acontece. Mas isso é por um período curto e a gente sabe quando a consulta faz efeito e quando o remédio faz efeito. Porque esse efeito de “rapport” da consulta dura no máximo 15 dias. Porque as pessoas, no dia a dia, na maioria das vezes, não têm profissionais que as escutem. Existem muitos clínicos alopatas que ouvem seus pacientes, que têm toda essa atenção e mais tempo com o paciente, mas na maioria das vezes as pessoas não têm tempo para falar de si mesmas. Eles falam sobre o que estão sentindo e já recebem tratamento. Então, quando a pessoa tem tempo de falar de si mesma, de contar o seu sofrimento, isso só mobiliza muita coisa da pessoa que já traz um certo alívio. Não vai curá-lo da doença, mas dá algum alívio. E se não continuar o tratamento, volte. Porque como não é possível identificar um princípio ativo, uma coisa material, uma cor, eles acham que o paciente está tomando água. E esse efeito placebo se desfaz no tratamento de animais, no tratamento de crianças pequenas e pacientes em coma. Não tem efeito placebo. E outra coisa interessante, nos estudos que acompanhamos na medicina convencional, 30% dos medicamentos alopáticos são placebos, têm efeito placebo.

Podemos dizer que o tratamento homeopático é eficaz, promove o reequilíbrio do organismo, não oferece efeitos colaterais como medicamentos químicos e tem um custo bem menor. Mesmo assim, sua expansão não ocorre. Porque?
Principalmente porque a medicina hegemônica é alopática. Para a homeopatia entrar na academia, dentro da universidade, não é uma coisa fácil, porque são paradigmas diferentes. Para fazer pesquisa na área da homeopatia é muito difícil conseguir financiamento privado dessa pesquisa, você precisa da academia. A maioria das pesquisas alopáticas é financiada pela indústria farmacêutica e não temos essa indústria para financiar essa pesquisa em homeopatia, precisaríamos entrar na academia. E dentro da própria academia existem muitas resistências. Mas a homeopatia já existe em várias universidades.

Em que estágio se encontra o serviço homeopático no serviço público brasileiro?
Existe uma política nacional chamada PNPIC, ou seja, a Política Nacional de Práticas Integrativas e Complementares do Ministério da Saúde, há muito tempo, onde são contempladas essas práticas de homeopatia, acupuntura, fitoterapia, termalismo. Era para ter sido implementado há muito tempo “full time”, mas existe uma portaria que regularia essa política. Mas essa portaria não pôde ser aproveitada porque a própria Associação Médica Brasileira proibiu porque na especialidade de acupuntura muitas outras profissões queriam fazer acupuntura e não seria mais um ato médico. Está tudo meio travado. Mas há política em todas as prefeituras. O SUS é descentralizado e o gestor é quem decide como fazer ou não. Aqui em Campo Grande, por exemplo, a especialidade de homeopatia funciona no CEM – Centro de Especialidades Médicas do SUS, onde estão os especialistas. Tem atenção primária, que é atenção primária em Unidades Básicas de Saúde, postos de saúde, e tem atenção secundária, que é nesse centro de especialidades com vários especialistas, inclusive homeopatia. Temos homeopatas atendendo pela manhã, tarde e noite. São cerca de 8 homeopatas e olha o paradoxo: há uma agenda ociosa, mesmo com tanta demanda, porque os pacientes, por conta do sistema de regulação do SUS, são encaminhados da Unidade Básica de Saúde para o CEM, para o especialista e muitos colegas não encaminham o paciente para a homeopatia, o paciente tem que ir lá perguntar, dizer que quer uma consulta homeopática. Há uma certa resistência em torno disso por causa da desinformação. Acho que precisa haver palestras mais informativas para os colegas entenderem como funciona a homeopatia. Os próprios colegas criam esse muro para os pacientes chegarem ao CEM.

Quais são as barreiras a serem superadas pela homeopatia hoje?
De fato, a homeopatia, à medida que os pacientes tomam conhecimento dessa questão, porque estão adoecendo e buscam uma nova explicação para isso, não pensando que estão doentes por acaso, porque o tempo mudou, porque é uma doença que acontece, estão se apropriando a si mesmos e à procura de novas formas de cuidar de si. A questão toda está mesmo na formação de novos homeopatas. Hoje é uma grande preocupação nossa e um debate que trazemos para este congresso. A homeopatia é a segunda das 52 especialidades médicas que existem na Associação Médica Brasileira, somos os segundos mais velhos em idade. A média dos homeopatas é de 55 anos, temos poucos jovens em homeopatia. E por que isto? Não é apenas uma questão de homeopatia, porque a grande maioria dos jovens que ingressam na faculdade de medicina não tem mais essa vocação, estão buscando algo que dê retorno financeiro.

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