Reduzir o estigma nas empresas reduz o estresse emocional, diz pesquisa

Pesquisa realizada pelo grupo Gattaz Health&Results, que utilizou inteligência artificial (IA) para diagnosticar a saúde mental de 86 mil funcionários de 30 grandes corporações do Brasil, incluindo Petrobras e Vale, permite o diagnóstico de grandes populações por meio de questionário enviado por e-mail ou celular telefone. As respostas são mais de 95% corretas em fazer uma hipótese diagnóstica.

O programa de saúde mental implantado nessas empresas após o estudo é baseado, em primeiro lugar, em informações, explicou o diretor geral do grupo, professor de Psiquiatria da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP), Wagner Gattaz , no 39º Congresso. Associação Brasileira de Psiquiatria, promovida pela Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em Fortaleza.

“O passo inicial é informar para diminuir o estigma. Ao reduzir o estigma, as pessoas estão dispostas a preencher o questionário e reduzir o estresse emocional”, explicou. Feito isso, são encaminhadas estratégias de tratamento e também para promover o bem-estar e, com isso, promover a saúde mental, prevenindo transtornos, inclusive a síndrome de burnout, além de ansiedade e depressão.

Segundo o professor da USP, os resultados encontrados são diferentes da população geral. “Uma descoberta interessante é que, na população em geral, 20% das pessoas têm transtorno de ansiedade. Nos trabalhadores, é de 5%”, disse Gattaz, acrescentando que isso se explica porque, para trabalhar, a pessoa passa por uma entrevista, e mesmo que o pessoal de recursos humanos não seja psicólogo, sabe detectar quando o candidato está nervoso.

Estudos mostram que uma pessoa com ansiedade tem menos probabilidade de conseguir um emprego. “Eu diria que é uma seleção natural. Não é que o trabalho reduz a ansiedade, é que quem tem ansiedade não consegue trabalho”, disse Gattaz.

Outros resultados

Do universo de 86 mil funcionários analisados, 13% foram diagnosticados com depressão grave e quase 50% com sintomas depressivos. Wagner Gattaz disse que a porcentagem de funcionários com depressão grave precisa de tratamento. A taxa é ligeiramente superior aos 12% encontrados na população geral há 10 anos. O professor disse que o aumento ocorreu durante a pandemia de Covid-19.

O risco de uso de álcool foi encontrado em 9% dos entrevistados, o dobro do que era há 10 anos (4%). “Na verdade, sabemos que, na pandemia, as pessoas passaram a beber mais, a consumir mais bebidas diferentes”.

Outro achado importante refere-se ao burnout, que é uma condição associada ao trabalho, que atinge cerca de 20% das pessoas nesta amostra de mais de 80.000 trabalhadores. No levantamento anterior, que englobou a população total, a taxa encontrada também ficou em torno de 20%. No entanto, no estudo recente, o índice variou muito entre as diferentes atividades e, principalmente, entre os diferentes chefes dos diferentes grupos de trabalho. Segundo Wagner Gattaz, “isso remete muito a um fator de proteção também para o líder”.

Gattaz destacou, por outro lado, que o número de pessoas afetadas no ambiente de trabalho pelo burnout varia dentro da própria empresa e entre as profissões. “Normalmente, o burnout é maior em pessoas que têm contato direto com o público, por exemplo, bancários, que trabalham no caixa e em que o índice chega a 70%”. Em outras empresas, são encontradas áreas com baixo burnout. Isso depende muito não só da profissão e da atividade, mas também da liderança, disse Gattaz.

O treinamento de liderança faz parte do programa do grupo do professor Gattaz para reduzir o risco ambiental de burnout. O fator de proteção mais forte contra o burnout é promover o suporte social no ambiente de trabalho. “Bom contato com os gestores, com os colegas, comunicação assertiva e clara, tudo isso evita o burnout como fator ambiental”.

A Covid afetou esses números e, em particular, as pessoas que trabalham em casa, devido ao distanciamento social, medo de contágio e perda de emprego. Esses fatores aumentaram o estresse e a sobrecarga de trabalho e também aumentaram o risco de burnout. “Encontramos cerca de 40% a 50% em algumas áreas”, disse Gattaz.

Autonomia

Além da maior comunicação que deve existir entre superiores e subordinados, o grupo de estudo recomendou às empresas um fator que reduz o burnout, a autonomia, quando a empresa dá ao funcionário “o poder e a capacidade de decidir o que fazer, quando fazer e como fazer”.

Embora o home office tenha aumentado a sobrecarga, algumas pessoas começaram a trabalhar melhor em casa. “Isso surpreendeu muitas empresas que, a princípio, não queriam saber do home office e de repente viram que os funcionários estavam produzindo mais. Isso aconteceu, além dos fatores óbvios como não perder tempo no trânsito, entre outros, pois a pessoa que trabalha em casa tem autonomia. Ela sabe a que horas pode acordar, sabe a que horas tem o pico mais alto de produtividade e criatividade. Então você pode decidir quais são os melhores horários para ela. Com essa autonomia, a produtividade aumentou”, explica.

Outro fator utilizado pelas empresas é o índice de distância do poder, ou seja, como as hierarquias são determinadas na empresa. Quanto maior esse índice, maior o risco de burnout, pois a pessoa, ao invés de respeitar o líder, tem medo dele. “O líder não é respeitado. Ele é temido. A hierarquia não é uma coisa natural, mas forçada. Tudo isso emplastra o ambiente de trabalho e aumenta o risco de burnout”.

Outro fator que gera burnout é a demanda para produzir mais em menos tempo. O psiquiatra alertou que se há demanda, por um lado, e, por outro, fatores de proteção, como suporte social e autonomia, o risco de burnout acaba equilibrado.

A recomendação de Wagner Gattaz às empresas para que mantenham a saúde mental de seus colaboradores envolve a promoção de programas de saúde mental e resiliência, em primeiro lugar, e mudanças de estilo de vida, como alimentação saudável, atividade física, relacionamentos.

“Quando isso é incentivado, a pessoa se sente mais saudável e com menos desgaste no ambiente de trabalho. Também é necessário oferecer treinamento no manejo e gerenciamento do estresse, especialmente treinamento de relaxamento. O atenção plena (mindfulness) é uma arma muito poderosa para reduzir riscos”, disse ele.

Ao oferecer esses elementos aos colaboradores, a empresa capacita lideranças para estimular fatores de proteção no ambiente de trabalho, que são autonomia, apoio social e ambiente de proximidade com o poder. Algumas empresas adotaram a ginástica laboral dentro do ambiente de trabalho. Gattaz assegurou que já está cientificamente comprovado que isso reduz o desgaste e tem efeito promotor na saúde mental e no bem-estar.

* A repórter viajou a convite da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP)

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