As infecções ortopédicas são consideradas de difícil tratamento e requerem tratamento prolongado. Fatores como formação de biofilme e seleção de bactérias persistentes contribuem para a dificuldade de controle da condição.
A gestão de infecções associadas à presença de próteses tem uma complicação adicional devido à possibilidade de remoção do dispositivo. Uma abordagem amplamente adotada é que, em infecções consideradas agudas, ou seja, com menos de três semanas de sintomas em infecções de origem hematogênica ou menos de três meses da artroplastia original em casos de origem pós-operatória, a prótese poderia ser mantida. Nas infecções crônicas, nas quais há maior risco de presença estabelecida de biofilme, a prótese deve ser retirada e, nos casos em que isso não for possível, está indicado o uso de antibióticos supressores.
Transição para antibioticoterapia oral
O uso prolongado de antibióticos intravenosos está associado a uma maior possibilidade de eventos adversos, infecções e outras complicações, como flebite e formação de trombos. Por esses motivos, a possibilidade de utilização de terapia oral torna-se atrativa para infecções ortopédicas.
Para esta prática, alguns requisitos e características dos antimicrobianos devem ser observados. Inicialmente, o tratamento deve ser com antibiótico intravenoso com atividade bactericida por uma a duas semanas, seguido de antibiótico oral com atividade antibiofilme por onze semanas.
Esses antibióticos com atividade antibiofilme devem não apenas ser capazes de penetrar nos biofilmes formados, mas também ter atividade contra bactérias persistentes, que apresentam metabolismo reduzido. Isso impacta na escolha dos antimicrobianos, pois alguns, como a vancomicina, não possuem boa penetração no biofilme e outros, como os beta-lactâmicos, precisam que as células bacterianas estejam se dividindo para serem ativas.
Para considerar a escolha de um antibiótico para compor o esquema de tratamento oral, outra característica a ser observada é a sua biodisponibilidade. A maioria dos beta-lactâmicos, por exemplo, tem biodisponibilidade oral abaixo de 90%.
Na prática atual, os principais antimicrobianos prescritos, com características adequadas para serem utilizados como tratamento oral em infecções ortopédicas, são a rifampicina – para o tratamento de Gram-positivos – e as fluoroquinolonas – para o tratamento de Gram-negativos.
Outro fator complicador a ser considerado são as interações medicamentosas, principalmente em esquemas contendo rifampicina. Vários antibióticos interagem com a rifampicina, o que pode diminuir a eficácia da terapia quando usada como terapia combinada. Exemplos incluem clindamicina, doxiciclina, linezolida, moxifloxacina e trimetoprima-sulfametoxazol. Considerando as interações, estudos sugerem que as melhores associações com a rifampicina seriam levofloxacina, moxifloxacina ou clindamicina.
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Estudos avaliando antibioticoterapia oral precoce
OVIVA foi um estudo multicêntrico realizado no Reino Unido que incluiu pacientes com qualquer infecção óssea ou articular que normalmente seria tratada com seis semanas de terapia intravenosa. Os participantes foram randomizados para receber tratamento IV ou oral sete dias após a cirurgia. O desfecho primário foi a falha do tratamento em um ano.
Dos 1.054 pacientes incluídos (527 em cada braço), 30% apresentavam osteomielite sem implante e 60% possuíam aparelho ortopédico. A maioria das infecções foi causada por estafilococos, com Staphylococcus aureus sendo o agente mais frequente. Os principais esquemas intravenosos utilizados foram glicopeptídeos (41%) e cefalosporinas (33%), enquanto os antibióticos orais mais frequentes foram quinolonas (36,5%), terapia combinada (16%), penicilinas (15%) e macrolídeos (13%). Os resultados demonstraram que a mudança precoce para antibioticoterapia oral não foi inferior ao desfecho primário em comparação com o tratamento IV.
Outro estudo, realizado em um hospital universitário francês, avaliou os resultados do tratamento de infecções ortopédicas com dispositivos causados por S. aureus. O estudo foi retrospectivo, com dados de pacientes internados entre 2008 e 2015. Para inclusão, além de apresentar infecção monomicrobiana por S. aureus, os indivíduos deveriam ter sido submetidos a tratamento cirúrgico adequado de acordo com as recomendações internacionais. O desfecho primário foi falha no tratamento, definida como recorrência de infecção estafilocócica.
Um total de 140 pacientes foram incluídos, dos quais 81% tiveram infecção por MSSA, 38% tiveram infecção associada à prótese articular, aproximadamente 50% não tiveram a prótese removida e 85% receberam cinco dias ou menos de terapia intravenosa. Os esquemas mais utilizados foram a rifampicina associada à ofloxacina ou sulfametoxazol-trimetoprim.
Os fatores de risco associados à falha do tratamento foram infecção por MRSA (que é diferente dos resultados de outros estudos semelhantes, onde o perfil de sensibilidade não impactou o resultado do tratamento), obesidade e terapia empírica inadequada. A terapia oral precoce não foi associada à falha terapêutica.
Outras possibilidades
Outras possibilidades, com tratamentos ainda mais curtos, estão sendo avaliadas. O estudo SOLARIO está em andamento e avaliará o tratamento de infecções ortopédicas com a administração de antibióticos locais associados a cursos curtos (até sete dias) em comparação com cursos longos (pelo menos quatro semanas) de antibióticos sistêmicos.
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